As urgências da humanidade
Jornal eletrónico “Sete Margens”,
Artigo - https://setemargens.com/as-urgencias-da-humanidade/
Margarida Cordo | 30 Out 2022
No anterior artigo que publiquei no 7MARGENS e no qual invoquei o Dia Mundial da Saúde Mental, prometi referenciar algumas urgências da humanidade, como proposta para construir a esperança num mundo melhor e, consequentemente, enfrentar e combater, no que de cada um depende, algumas fraturas relevantes da humanidade. Sou consciente de que muito mais propostas inadiáveis haveria a fazer, mas fico-me pelas que, abaixo, invoco, pois não me quero repetir face a outros meus escritos e acredito que os caminhos consistentes são aqueles que percorremos devagar, mas solidamente, simplesmente porque, de facto, temos pressa.
Diria que este texto, embora independente, é uma espécie de anexo.
Assim, para o bem-estar do humano:
– Urge (re)construir uma saudável relação com o tempo (e, sobre isto, não me canso de me repetir). Einstein dizia que a falta de tempo é a desculpa daqueles que o perdem por falta de método;
– Urge ser-se quem e como se é, tendo a coragem de começar a desenvolver contributos para aquilo a que gostaria de poder chamar a Pastoral da Autenticidade;
– Urge perceber que, diria eu, não é cristão viver de aparências;
– Urge não ignorar que a vida humana é apenas uma etapa da existência;
– Urge aprender a adiar a gratificação, sabendo que, como alguém recordou, o único lugar em que o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário;
– Urge centrar-se no essencial, vivendo de discrição e não de exibição;
– Urge ser e estar no concreto e não “atrás” do mundo virtual;
– Urge repensar a solidariedade, primeira vocação do ser humano, e empenhar-se nela;
– Urge partilhar pessoalmente e escutarmo-nos uns aos outros, vivendo o momento presente com sentido e gratidão.
E, se é verdade que cada um deve evoluir a partir do patamar em que se encontra, disse-o Walter Rizzo, nada justifica que, para mais ter, se esmague a dignidade de outros que são explorados e veem a sua liberdade limitada pelos senhores da posse e do poder.
Todo o homem deveria ser obrigado a não esquecer que um dia morrerá, não para trabalhar para o epitáfio, mas para saber que não é dono de coisa alguma.
Os que somos considerados conservadores, na maioria das vezes apenas porque somos católicos, acabamos por ser os mais progressistas, pois pomos as mãos na massa a discutir e a tentar agir de modo a colmatar as fraturas atuais do mundo chamado desenvolvido
Precisamos de arranjar disponibilidade para ESCUTAR E VER o outro, o mundo e Deus; desmistificar o ESFORÇO e melhorar a relação com este, sobretudo nas camadas mais jovens.
Parece, afinal, haver muito que está ao nosso alcance nesta mudança urgente. Cada um tem de atuar no seu território, mesmo que seja mínimo, com persistência e perseverança, que são verdadeiras chaves do sucesso.
Precisamos de acreditar que pode ser mais simples do que julgamos isto que é mudar o mundo. Está, afinal, nas mãos de todos nós. Como disse Jô Soares numa entrevista dada talvez dois anos antes da sua morte, queria ir daqui com a convicção de ter deixado, nos outros, alegria e esperança e sem ter feito mal a ninguém.
Temos, pois, algumas aquisições a pôr em marcha e, sobretudo, temos de perder o medo da tranquilidade e do silêncio–escuta, através do qual crescemos em humildade e em respeito mútuo, valorizamos a simplicidade, honramos os nossos compromissos, descontraímos do stresse do dia-a-dia e agradecemos as nossas circunstâncias, ainda que as de outros nos pareçam bem melhores.
Se nos empenharmos nestas simples propostas em que o disfarce e a representação de papéis de faz de conta deixam de ter lugar, seremos decerto mentalmente muito mais saudáveis e teremos, aqui, um lugar muito melhor para existir.