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A Adição e a Família

O termo adição inclui a dependência química a álcool e drogas, estendendo-se a outros comportamentos aditivos nos quais o objeto de obsessão e compulsão pode ir desde a comida, ao jogo, ao sexo ou ao exercício físico, nomeando apenas as mais frequentes e socialmente reconhecidas como disruptivas do funcionamento adequado de um indivíduo.

Com qualquer funcionamento aditivo, de natureza obsessivo-compulsiva, logo se começa a verificar um grau de inevitabilidade e imprevisibilidade no comportamento que desencadeia e alimenta um estado de progressiva desorganização e caos nas mais diversas áreas. saúde física, estado psiquiátrico e psicológico, relações familiares e sociais, performance profissional, possibilidade de vida espiritual, são áreas que nunca poderão passar incólumes a qualquer padrão de funcionamento dependente que se instale na vida de uma pessoa.

A família, enquanto enquadramento de base das nossas vidas, sede de preenchimento das nossas mais básicas e prementes necessidades é desde logo invadida e progressivamente degradada por este funcionamento patológico, desenvolvendo também ela enquanto núcleo, e cada um dos seus membros, padrões carregados de disfuncionalidade e sofrimento psicológico.

Se é, por exemplo, absolutamente reconhecido que os consumos abusivos e prolongados de uma substância como o álcool, socialmente aceite e cujo abuso é repetidamente desvalorizado, propiciam alterações psicológicas e comportamentais significativas no consumidor abusivo, é igualmente verdadeira a forma como os familiares sofrem consequências similares. Se um alcoólico tem no seu consumo de álcool um seguro fator desencadeante de um estado depressivo, também um familiar próximo, repetidamente exposto à impotência que sente pelo comportamento da pessoa a quem está afetivamente ligado, de quem gosta, com quem se preocupa e angustia, e a quem vê diariamente adoecer, afastar-se, desmotivar-se perante todas as suas tarefas pessoais, sociais e profissionais, no fundo perder o sentido e desmobilizar-se perante a vida, padece de níveis internos de sofrimento que o podem igualmente conduzir a um estado de depressão clínica.

A realidade é que a adição, em todas as suas possíveis manifestações, é uma doença tratável, com sintomas e disfuncionalidades reversíveis. Só que é igualmente uma doença em que, infelizmente numa larga maioria, os que dela sofrem mostram dificuldade e resistência em admiti-la ficando, assim, desde logo mais incapacitados para pedirem a ajuda de que realmente necessitam.

Reconhecer o consumo abusivo de álcool e/ou drogas como problemático, admitir perante si próprio e outros a impotência perante os mesmos, aceitar como real e grave a manifesta incapacidade de controlar um comportamento obsessivo-compulsivo que se foi progressivamente tornando o “centro da vida”, é o primeiro passo para a necessária mudança de atitude perante o problema.

Partindo-se da identificação dos sintomas de dependência e aceitando-se a necessidade de ajuda pode desenvolver-se a busca do plano de intervenção aos níveis médico e psicoterapêutico mais adequado a cada caso individual. Idealmente, este processo de confronto com a doença e consequente procura de estratégias para alcançar um estado de remissão de sintomas é enquadrado num contexto familiar envolvido e implicado. Os familiares são, para além do próprio, os principais lesados pela adição ativa, quem melhor a conhece, descreve e sente na pele. Podem assim também ser, se eles próprios procurarem recuperar-se, agentes da mudança, confrontando o adicto com as consequências da sua dependência e ajudando-o a encaminhar-se para a melhor via de intervenção possível.

Avaliando-se a necessidade de um plano de longa duração pode recorrer-se ao internamento para desabituação física e posterior trabalho psicoterapêutico. Em regime ambulatório é essencial uma avaliação cuidada e profunda para que o trabalho seja adequado ao histórico e recursos disponíveis do indivíduo. É essencial o desenvolvimento de novas competências, a reformulação das estratégias de coping para lidar construtivamente com os sentimentos e situações a que outrora o adicto respondia com o “alívio” imediato dos consumos. Trabalhar consistentemente a motivação para a mudança é igualmente vital para a manutenção de um estado de abstinência e prevenção de recaídas.

A adição provoca anualmente milhares de mortes, por suicídio, acidentes, overdose e sequelas físicas, consequência dos consumos. Sem intervenção adequada muitos dos que sofrem de dependência morrerão prematuramente ou, no mínimo, viverão muito aquém do seu verdadeiro potencial afetivo e espiritual, inviabilizando a família e todos os que deles gostem e sintam na vida como significativos, de ter uma vida plena e satisfatória.

 

Susana Cerqueira

susana.cerqueira@conforsaumen.com.pt

 

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